12 mitos da educação brasileira [ titulo
original ]
Texto: Gustavo iochepe
1. "O Brasil investe pouco em educação"
·
“Se um médico prescreve um remédio para uma doença e ele não surte
efeito, a primeira opção é aumentar a dosagem. Se o problema persistir,
provavelmente o médico tentará outro medicamento. Quando o assunto é educação,
a lógica segue o caminho oposto: a solução para todos os problemas é sempre
aumentar a dosagem do que se considera o único remédio, ou seja, o dinheiro. Os
defensores desse tratamento desconsideram o fato de que repasses de verba cada
vez maiores já foram anunciados por programas como Fundef e Fundeb sem melhorar
a qualidade da educação. Apesar disso, o Plano Nacional de Educação,
recém-sancionado pela presidente Dilma Rousseff, prevê que, até 2024, 10% do
PIB brasileiro deve ir para o setor. Segundo a Unesco, países como Finlândia,
China, Irlanda e Coreia do Sul, que apresentam os melhores índices educacionais
do mundo, gastam até 5,7% do PIB com educação. Em contraponto, nações como
Quênia, Namíbia, Armênia e Mongólia despendem entre 7% e 12,9% do PIB no setor:
mesmo assim, não conseguiram solucionar o problema da baixa qualidade do
ensino.”
w· 2. "Os professores são mal remunerados"
“No Brasil, o salário da maioria dos profissionais, como médicos,
engenheiros, artistas e professores, é em média 3,5 vezes inferior ao pago a
profissionais das mesmas categorias nos Estados Unidos. A diferença salarial é
explicada pelo PIB per capita de cada país. O professor ganha pouco por ser
brasileiro, não por ser professor. O argumento comum, porém, é de que se o
Brasil quiser atingir o patamar educacional de países desenvolvidos, como os
próprios Estados Unidos, deve pagar o mesmo a seus docentes. Isso desconsidera
o fato de que quase 80% do gasto com educação aqui são destinados a pagar
salários de professores e funcionários. Se pagarmos aos docentes brasileiros,
em termos nominais, o mesmo que os americanos recebem, eles seriam a única
categoria a atingir esse patamar salarial no Brasil. Os demais profissionais,
contudo, continuariam a ganhar 3,5 vezes menos.”
3. "Ganhando mais, os professores vão ensinar mais"
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"Não há, na literatura empírica nacional e internacional,
provas de que salários mais altos influenciam a melhora na qualidade do ensino.
Uma simples constatação disso é que os sucessivos aumentos no piso salarial dos
docentes brasileiros até hoje não tiveram reflexos nos índices educacionais e
também não solucionaram os problemas das greves, que continuam a acontecer
todos os anos. O sistema educacional é perverso: se o professor faz mal o seu
trabalho e ainda assim ganha mais, por que lutar para fazer um trabalho melhor
que não trará mais ganhos?”
· 4. "As salas de aula têm alunos demais"
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“Este é um dos mitos comumente relacionados à baixa qualidade do
ensino e à necessidade de aumento salarial dos docentes. A relação, porém, não
resiste à apuração de pesquisas empíricas. Elas mostram que, em salas com menos
de 20 alunos, a turma aprende o mesmo que em uma sala mais cheia. O único fator
que faz diferença real é o professor e sua capacidade de gerir uma sala de aula
e transmitir conhecimentos para um grupo.”
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5. "Escola em tempo integral vai melhorar os índices
educacionais"
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"Há evidências de que mais horas-aula melhoram o desempenho
acadêmico. O problema é que a carga horária brasileira, que já não é alta,
raramente é cumprida, e a maioria dos programas de ensino integral praticados
no Brasil oferecem atividades não-acadêmicas, como música e esporte, no
contraturno. Nesse modelo, o ensino em tempo integral é um desperdício. A
primeira prioridade deveria ser usar o tempo de aula de modo eficiente, pois o
Brasil é um dos países que mais desperdiça tempo com atrasos de professores e
alunos, anúncios, chamada etc. Quando essa carga horária estiver bem ocupada, e
quando os programas no contraturno forem de português, matemática e outras
disciplinas, o desempenho dos alunos vai melhorar. Nesse caso, eu seria
totalmente favorável à iniciativa."
·
6. "A tecnologia vai resolver o atraso escolar"
“Praticamente toda a pesquisa sobre o assunto, não apenas no Brasil como
no exterior, mostra que não há relação entre a presença de computadores na
escola e aprendizado. Ainda assim, o Ministério da Educação decidiu em 2012 dar
tablets aos professores, um custo de 150 milhões de reais. O fracasso atual das
tecnologias em sala de aula não quer dizer que elas não possam dar resultados
no futuro. A utilização de softwares específicos para aprendizado tem mostrado
resultados positivos, principalmente em matemática. Mas o melhor software
educacional disponível hoje é, disparado, o cérebro de um bom professor."
7. "A escola tem que formar cidadãos críticos e
conscientes"
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“Esse argumento reflete a ideologização do ensino, presente em
todas as escolas brasileiras. Pesquisas do Inep (órgão ligado ao MEC responsável por pesquisas
educacionais) com professores mostram que nove em cada dez docentes concordam
com a afirmação de que ‘o professor deve desenvolver a consciência social e
política das novas gerações’. Menos da metade, no entanto, acredita que ‘o
professor deve evitar toda forma de militância e compromisso ideológico em sala
de aula’. Essa percepção, além de alterar o conteúdo a ser ensinado, afeta a
forma como ele chega aos alunos: por isso, trabalhos em grupo passaram a se
sobrepor a exercícios individuais, notas e provas passaram a ser vistas com
maus olhos e recompensar o mérito acadêmico é equivalente a premiar uma
competitividade nefasta. É impossível, porém, medir se essa filosofia está
efetivamente criando cidadãos críticos e conscientes ou apenas se sobrepondo ao
ensino dos conteúdos.”
· 8. "Rankings educacionais não levam em consideração a realidade
das escolas
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"É verdade que os rankings educacionais não consideram
fatores socioecômicos. O que se esconde por trás desse mito, contudo, é a ideia
de que por causa disso eles não podem ser considerados bons termômetros para a
educação, como apontam os críticos das avaliações externas nacionais e
internacionais. Os rankings estão certos em não considerar esses fatores,
porque eles devem medir o conteúdo que está sendo ensinado em uma determinada
etapa de ensino, independente da localidade da escola. Se eles considerassem o
fator social, esse serviria apenas de muleta para justificar o fato de que em
regiões mais pobres os alunos aprendem menos e não há nada a ser feito. Com os
rankings isentos dessas peculiaridades, é possível saber onde está o problema e
minimizar fatores externos ao ensino dos conteúdos com uma política educacional
específica. Onde há déficit econômico, é preciso haver superávit
educacional."
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9. "Divulgar a nota do Ideb na porta das escolas
estigmatizaria alunos"
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A divulgação das notas do Ideb (Índice de Desenvolvimento da
Educação Básica, que mede o fluxo escolar e o desempenho dos estudantes em
avaliações nacionais) nas
escolas é uma campanha que defendo há algum tempo. A medida já foi aplicada em
Estados como Minas Gerais e Goiás e até o momento não foi constatado nenhum
prejuízo psicológico aos alunos, nem nas escolas com as piores notas. Não há
explicação lógica em pensar que uma criança seria humilhada por saber que
estuda em uma instituição que não está oferecendo bom ensino. Pelo contrário: a
divulgação dos dados educacionais deve servir para que as famílias cobrem melhorias
e, ao mesmo tempo, para que as escolas tomem consciência de que precisam
melhorar."
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10. "Universidade pública deve ser gratuita"
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"A cobrança de mensalidade para alunos ricos foi uma das
primeiras bandeiras que defendi. Quando fui aprovado na Universidade Federal do
Rio Grande do Sul, onde estudei apenas três semanas antes de ir para os Estados
Unidos, cheguei a procurar a reitoria para que eu pudesse colaborar com a
instituição de alguma forma, pagando mensalidade ou fazendo doações. Minha
família pagou pelo ensino básico e não via razões para eu estudar gratuitamente
no ensino superior. A universidade negou minha tentativa veementemente. A
prática funciona perfeitamente em outras nações, como Austrália, Estados Unidos
e Chile, que recentemente anunciou a gratuidade a todos os alunos. Será um
retrocesso em um sistema educacional que colocou o país entre os melhores do
mundo. No Brasil, é fato conhecido por todos que os aprovados em instituições
públicas vêm de grupos econômicos mais favorecidos e a maioria esmagadora dos
alunos mais pobres acaba em faculdades privadas de baixa qualidade. A cobrança
não prejudicaria o sistema de ensino e traria subsídios para financiar os
estudos de quem precisa."
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11. "A sociedade está engajada na melhoria da
educação"
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É socialmente aceitável ter um discurso que mostra preocupação com
a educação, mas a maioria das pessoas não se importa realmente. Uma pesquisa do
Inep com pais de alunos mostrou que, em uma escala de satisfação de 0 a 10,
sendo zero muito insatisfeito e 10 muito satisfeito, a nota média dada pelos
pais às escolas de seus filhos foi 8,6. Se as famílias brasileiras apontam esse
nível de satisfação com o ensino público, muito dificilmente elas vão protestar
por melhorias. É preciso ponderar, contudo, que esses dados não revelam falta
de interesse por parte das famílias. Em muitos casos, os pais que não têm
instrumentalização para medir a qualidade da escola, pois sequer terminaram o
ensino básico. Para um pai, é muito difícil conviver com a ideia de que o filho
está com problemas na escola e que ele não pode ajudar. Se ele sabe que tem um
problema, mas não consegue apontá-lo, acaba se baseando em critérios mais
palpáveis, como o recebimento de uniforme, transporte e outros fatores que não
estão ligados diretamente ao aprendizado dos estudantes. Para reverter esse
quadro, é preciso voltar a um passo anterior: mostrar a ele a realidade do
sistema. O engajamento vem depois da conscientização do problema."
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12. "O ensino brasileiro está melhorando na velocidade
desejada"
"Governantes e até órgãos internacionais, como Unesco e OCDE,
gostam de ressaltar o crescente esforço do Brasil para melhorar a educação no
país. As melhorias, porém, são pífias se comparadas ao gastos no setor. O
problema do acesso ao ensino pode ter sido praticamente sanado, mas a qualidade
da oferta definitivamente não traduz o discurso feliz e eleitoreiro de muitos
porta-vozes."
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