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domingo, 21 de maio de 2017

A Falácia das Fronteiras Abertas

A Falácia das Fronteiras Abertas

Os libertários contemporâneos concordam em premissas básicas como o livre mercado, a propriedade privada e o princípio do voluntarismo; porém, em poucos assuntos discordam com tanta veemência como o fazem na questão da imigração. Devem ou não os libertários advogar fronteiras abertas?

Entre os libertários que argumentam contra esta ideia de fronteiras abertas (pelo menos enquanto o Estado Social existir) constam Murray Rothbard, Ron Paul, Milton Friedman, Hans-Hermann Hoppe, Stephan Kinsella, Lew Rockwell, Scott M. Rosen, o ex-candidato à presidência do partido libertário americano John Hospers, entre muitos outros. Do lado contrário, a favor das mesmas, entre  igualmente muitos, temos autores como Walter Block e praticamente todos (senão mesmo todos) os libertários ligados ao instituto CATO.

Na realidade, este debate parece uma falsa questão, mas não é. Parece uma falsa questão porque ambas as partes concordam que o Estado não devia ter o poder para excluir pessoas do território e ambas gostariam de chegar a um ponto onde todo o território estaria privatizado, permitindo aos indivíduos usarem os seus direitos de propriedade para escolherem quem desejam integrar na sua comunidade. Onde eles de facto discordam é no que fazer nas actuais circunstâncias onde existe uma vasta propriedade pública e um Estado Social. Os primeiros dizem que, nestas condições, fronteiras abertas são imorais porque forçam os nativos residentes a pagarem pela integração de outros que geralmente nem são desejados; já os segundos dizem que se devem eliminar totalmente os controlos de fronteiras pois o Estado não tem o direito de excluir seja quem for do território.

Para inferir ideias para o actual contexto real, é importante gerar uma experiência de pensamento no sentido de reflectir sobre como se processaria o fenómeno migratório numa sociedade totalmente privatizada onde não há fronteiras estatais. Ao contrário do mundo indiscriminável (quase) perfeito que os libertários “fronteiras abertas” advogam, um cenário em que os indivíduos possuem plenos direitos de propriedade será um cenário onde as pessoas os irão usar como mecanismo para integrar ou excluir terceiros; por outras palavras, irão discriminar de forma a viverem rodeados do tipo de pessoas que preferirem, usando o direito natural de associação para o efeito. É essa a real noção de direitos de propriedade: a capacidade para discriminar, associar, acolher ou excluir outros nas nossas propriedades.  A imigração não passaria a ser “livre” no sentido em que o único critério de integração passaria por um preço de mercado, mas sim por cumprir requisitos que os proprietários iriam criar para definirem a qualidade da sua vizinhança mediante as suas preferências.

O erro que os proponentes das fronteiras abertas normalmente cometem é o de confluir a desejável ausência de fronteiras nessa sociedade “nirvanesca” totalmente privatizada com as fronteiras abertas de Estados que possuem um sistema de providência e vasta propriedade estatal. No actual contexto em que vivemos, fronteiras abertas não seria mais do que integração forçada, no sentido em que obriga os contribuintes nativos de cada país a pagar (via Estado providência) pela integração de pessoas que os primeiros não escolheram, não seleccionaram, nem têm formas eficazes de filtrar. Porque neste contexto, estando desprotegidos, os nativos não têm o mecanismo de selecção e discriminação dos plenos direitos de propriedade, essencialmente devido a leis anti-discriminação e ao Estado providência que força, a título de exemplo, um contribuinte a financiar casas sociais para imigrantes na sua vizinhança contra a sua vontade.

Ademais, porque as populações são na sua esmagadora maioria contra imigração em massa (basta verificar que nenhum partido, por mais progressista que seja, concorre com um programa de fronteiras abertas se quiser vencer eleições nacionais), a actual imigração em número inimagináveis que se verifica na Europa e EUA é resultado em larga medida de rent-seeking; ou seja, as principais empresas capturam o processo político através de lobbies constantes no sentido de adquirir mão de obra barata. Se essas mesmas empresas tivessem que pagar todos os custos de vida dessa mão de obra barata num país desenvolvido, esta última deixaria de ser barata e perderia o interesse. O que estas empresas essencialmente fazem é adquirirem empregados baratos apenas porque todos os outros custos (educação, habitação, saúde, etc…) recaem sobre o contribuinte nativo.

Qualquer economista sabe que, pelo menos até se acabar o financiamento, quando se subsidia algo vamos ter mais desse mesmo algo. Em concomitância, quando se subsidia a imigração, ela cresce exponencialmente; e cresce à custa de um contribuinte impotente perante esta integração forçada.

Muitos dos defensores das fronteiras abertas estão conscientes desta imoralidade que se atravessa nas suas reivindicações morais. Mas como não querem esperar pela devolução de mecanismos de selecção aos indivíduos, muitos alegam  que abrir completamente as fronteiras no imediato é a melhor forma de fazer com que o Estado providência impluda, visto que a invasão de imigrantes do terceiro mundo colocaria pressões no sistema que levaria a esse resultado. Contudo, depois desse colapso, o que se seguiria não seria o mundo maravilhoso libertário, mas sim guerras civis entre os mais variados grupos étnicos que lutariam pelos despojos políticos; por outras palavras, seguir-se-ia a balcanização (que na realidade está já a acontecer na Europa, mas isto será um tema para outro texto). Este é um preço demasiado elevado a pagar pelo fim do Estado social, principalmente quando este está já a colapsar lentamente mesmo sem as actuais fronteiras (totalmente) abertas.

A crítica por parte dos defensores das fronteiras abertas que no meu entender tem mais força é a de que o Estado não consegue emular os direitos de propriedade quando selecciona imigrantes. O argumento “enquanto existe Estado, mais vale que se comporte como um dono privado”é de facto complexo e difícil de justificar. Mas considero que tal prende-se com uma questão de perspectiva: não me parece que essa seja a melhor forma de colocar a questão; faz bastante mais sentido dizer que recursos que estão sujeitos a uma autoridade e são usados por utilizadores, como a propriedade “pública”, não deixam de precisar de regras que viabilizem a sua utilização e impeçam uma “tragédia dos comuns”, tal como precisariam se a propriedade fosse privada e aberta ao público. Emulação eficiente do mercado, claro, não existe, é por isso que se advoga a privatização, mas tal não elimina a premissa anterior (i.e. necessidade de regras).

Desta forma, a solução passa por aperfeiçoar esse sistema, melhorando-o no sentido de se ganhar qualidade em grau e não por mandar a água fora com o bebé. Não sendo um sistema perfeito de direitos de propriedade, o sistema suíço de imigração, por exemplo, é francamente superior em grau a quase todos os outros onde os burocratas imperam: as leis de imigração helvéticas são feitas descentralizadamente ao nível dos cantões e através da democracia directa os cidadãos podem seleccionar o tipo de imigração que pretendem assim como excluir a que não pretendem. Existe deste modo um mecanismo de selecção que na prática não existe noutras sociedades.

Para o liberalismo, nas actuais circunstâncias, o que faz sentido é advogar descentralização de poder/secessão e não fronteiras abertas.

Em suma, o direito à associação voluntária entre adultos é parte fundamental do sistema de direitos de propriedade; isto é, o direito de escolher o tipo de pessoas com quem desejamos viver, e tal implica discriminação, pois qualquer escolha é um acto de discriminação (prefiro A a B, logo discrimino). Numa era onde o espírito dos tempos é fundamentalmente igualitário, esta é uma lógica que é esquecida, até mesmo em campos filosóficos onde não se esperaria que tal acontecesse.

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