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quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Marxismo criticado por um feirante

Uma crítica feirante ao marxismo[titulo original]

O liberalismo foi chamado de “capitalismo” por Marx (e o apelido pegou) para ser pechado como uma filosofia de exploração e que “defende os ricos” e sua capacidade de acumular capital.
A despeito de Carl Menger, Böhm-Bawerk e outros terem cuidado de reduzir a pó essa visão que quase divide o mundo em castas (“classe” social, afinal, é um grupo mais estanque do que “espécie”, “gênero” ou “família” na taxonomia de Lineu), o preconceito permanece, e pouco se lê de tais baluartes da economia nas Universidades.

Marx, por outro lado, curiosamente é lido como curiosidade e nota histórica em um curso de Economia, nunca sendo levado mais a sério do que isto. No entanto, em cursos que lidam com símbolos, e não problemas e medidas auferíveis, como Sociologia, Letras, Psicologia ou História, é pedra de toque inquestionável das primeiras aulas às últimas (efeito semelhante ao que Freud e sua psicanálise obtém na Psicologia em relação a outros cursos).

Após três séculos em que a discussão acadêmica busca muito mais tomar o poder à força e impor suas vontades do que uma discussão adequada do jogo do poder (político, econômico ou cultural), a pregação estatizante está tão arraigada em nosso vocabulário que, quando se ousa defender a liberdade econômica, imediatamente se é indagado a explicar por que cargas d’água devemos deixar alguém trabalhar e ter os frutos do trabalho para si, e não ser tungado à força do produto de seu próprio trabalho para fins nunca bem esclarecidos. 
O que um liberal tem dificuldade em “justificar” perante plateias pouco afeitas a tal discurso não é o roubo: é o seu impedimento.

Ainda assim, pensa-se sempre através de um preconceito sistematizado por Marx e que, por mais que nunca se tenha tido contato com sua obra, está na boca do povo (e acadêmicos apenas refinam o vocabulário, mas nunca o conteúdo): um rico é rico explorando um pobre, que é pobre porque é explorado. A desigualdade econômica e a pobreza é reduzida a um jogo de gato e rato num círculo infinito, como Oroborus mordendo a própria cauda. Por tal perspectiva, defender que todos trabalhem e fiquem com os frutos do trabalho para si seria defender que os ricos permanecessem ricos, por serem donos dos meios de produção, e aos pobres fossem legados os trabalhos menos bem remunerados.

É uma teoria “totalizante” (ou seja, aparenta ser capaz de explicar toda a realidade), e exatamente por isso das mais perigosas e questionáveis – como o século XX viu bem, mas não aprendeu nada. Uma conta simples pode ser apresentada em contrapartida.

Não é necessário um conhecimento avançado da lei de oferta e procura para saber que onde há grande procura por um produto ou serviço, o preço deste vai aumentar. Não é por maldade de quem tem o produto ou serviço: é a mesma lei que diz que, no caso de escassez de um produto, como a gasolina, o preço deve subir para que apenas aqueles que necessitam de tal produto com mais urgência (como ambulâncias e bombeiros) o utilizem, e não quem quer comprá-lo naquele momento em busca de lazer.

 O preço livre, sem controle e flutuando através da competição, é um modo de conhecimento para determinados fins – como a competição no futebol é uma forma de descobrir quais são os melhores times e jogadores.

Uma praia, por exemplo, é um local onde há muita procura por água, cerveja, refrigerante e comidinhas extremamente simples de serem feitas (camarão e lula no vapor, batata frita e pastel), e onde se paga feliz, com sorriso de orelha a orelha, o triplo do preço de mercado nas CNTP (longe da praia) por tais gororobas. É difícil imaginar que algum milionário esteja “explorando” os “pobres” na praia com seu trabalho, sua barraquinha ou seu carrinho. Na verdade, a maior parte dos vendedores ambulantes neste ambiente são pobres com pouca instrução mas muita astúcia e inteligência: são empreendedores que nunca pisaram numa faculdade de Administração ou Economia, e vez por outra sabem mais sobre o mercado que seus alunos.

Ora, é mais fácil vender uma cerveja comprada a R$1,50 por R$3 ou R$4 numa praia, num estádio de futebol ou numa rodoviária. Não requer prática e tampouco habilidade. A margem de lucro líquido é incrivelmente maior do que a de um supermercado. Se por um lado se perde todas as garantias trabalhistas (emprego com salário fixo, aposentadoria etc), os encargos gastos com tais vantagens muitas vezes são maiores do que as próprias vantagens (que salário fixo para alguém sem instrução compensa ganhar dinheiro sendo “seu próprio patrão” numa linda praia em alta temporada?).

Apenas vendo tal “acúmulo de capital” sem “meios de produção” já se pode jogar no lixo mais da metade de O Capital. A estrutura esmiuçada do livro escorrega em tantos pontos da realidade mais ordinária que fica difícil convencer um feirante, um vendedor ambulante de churrasquinho na praia, o carro da pamonha ou um pipoqueiro da utilidade de tal obra.

Aliás, quanto se gasta para fazer uma pipoca? Fora o carrinho e as panelas (obrigatórios a todas as comidas quentes vendidas), óleo, milho e sal. Uma porção diminuta de milho e menos ainda de sal completam uma caixa grande de pipoca, vendida a R$5 ou até R$7 nas ruas de São Paulo. Será que a “teoria da exploração” marxista e seu séquito de admiradores cegos são capazes de enxergar a “mais-valia” exploradora de uma pipoca, mesmo as que não são da sala de espera de um cinema? (Sempre que pensar em um jantar no lugar mais caro da cidade, é para lá que você deve levar sua namorada).
O que se vê é que o gritante erro de Marx é uma tendência genocida à generalização.

 Tratar a História, mais complexa que James Joyce, como “história da luta de classes”, ou as pessoas que lidam com o comércio como “burguesia mercantil” (hoje, ainda por cima, misturando sem vírgula os conceitos de “elite” e “classe média”, de onde saem, justamente, os marxistas), ou, mal dos males, tratar cada “burguês” como “explorador”… Ora, quantos marxistas têm coragem de largar seus empregos públicos hiper-remunerados em troca de enfrentar o vai e vem do mercado, a época de vacas magras ou a complexidade de uma bolsa de valores para afirmar que é o “burguês” que explora? 

Quantos burgos havia em cada país do mundo, dos mais fechados (como o hoje rico e exportador Japão) aos com maior liberdade econômica (o que inclui o Welfare State nórdico) para se dividir toda a humanidade em classes estanques?

Ademais, há generalização maior do que tratar problemas locais de pobreza como uma eterna “culpa do sistema” como panaceia para todos os erros econômicos? É o equivalente a criticar o sistema nervoso pela dificuldade em tocar o Segundo Concerto de Rachmaninoff. 

Curiosamente, nenhum marxista sonha em atribuir os “problemas” da Cortina de Ferro (como o genocídio de mais de 100 milhões de pessoas em um século) a uma “culpa do sistema”…
E como fica a grita marxista, seus partidecos “operários” (todos os pobres urbanos são operários?) e suas saias neohippies caríssimas para convencer os vendedores de pastelzinho na feira, na praia e no terminal de ônibus para pagarem mais impostos, dividirem mais sua riqueza, estatizarem toda a economia, pegarem em armas para abrir guerra contra seus semelhantes e não terem mais o produto de seu trabalho para si? Se é fácil convencer um universitário de tantas “vantagens para os pobres”, por que não tentam convencer… os próprios pobres que enriquecem com o comércio antes de mais nada?

Devemos defender o liberalismo para enriquecer os pobres. É difícil pensar nos milionários brasileiros e descobrir qual deles obteve seu dinheiro da competição e da economia livre – pelo contrário. E, afinal, universitários podem falar melhor, mas é de se duvidar que entendam mais de dinheiro e de povo do que um competente feirante.

 Sobre o Autor

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Flavio Morgenstern é tradutor, redator e analista de mídia.
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